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O PIBID E O OUTRO LADO DA FORMAÇÃO: ENTRE A RACIONALIDADE TÉCNICA E CRÍTICA
Beatriz Pereira, Renato Sarti

Última alteração: 2021-12-02

Resumo


RESUMO


O presente trabalho busca compreender de que forma os modelos de formação hegemônicos e contra hegemônicos se aproximaram das disciplinas da graduação que estava cursando durante a minha atuação no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à docência. A abordagem metodológica História de Vida foi fundamental para identificar a aproximação do modelo vinculado a racionalidade técnica e dos resquícios da configuração curricular de 1969.

PALAVRAS-CHAVE: PIBID; formação de professores; currículo.

INTRODUÇÃO
Tendo como pano de fundo a minha trajetória formativa em um curso de licenciatura na Escola de Educação Física e Desportos (EEFD), o referido estudo trata-se de um recorte e continuação do trabalho de conclusão de curso que apresentei em Março de 2021. Ao resgatar a memória das minhas vivências por meio da abordagem metodológica História de Vida (DE SOUZA, 2007), busco compreender de que forma os modelos de formação hegemônicos e contra hegemônicos se aproximaram das disciplinas cursadas na Licenciatura em Educação Física, durante o período em que participei, simultaneamente, do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID).
O PIBID se desenvolveu no cenário do curso de Licenciatura em Educação Física na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em Agosto de 2018 e encerrou em Dezembro de 2019, com o “Subprojeto Educação Física UFRJ: Cultura Corporal, Autonomia e Conhecimento”. O subprojeto esteve atento no desenvolvimento de ações na interface entre o ambiente escolar e o universitário, com o objetivo de construir um “terceiro espaço” (ZEICHNER, 2010, p. 486), ou seja, um encontro em que as duas instituições coexistem, superando a ideia de que a academia está relacionada à apreensão teórica enquanto a escola, a prática.

FORMAÇÃO DE PROFESSORES: DA RACIONALIDADE TÉCNICA À CRÍTICA
O campo educacional tem sido alvo de interesse das grandes organizações econômicas como o Banco Mundial e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com a justificativa de que a educação é o fator diferencial para o crescimento econômico do país. Desse modo, Saul e Saul (2016) tem apontado à necessidade desses grupos conservadores em apoiar moldes de formação docente que ocupam posição hegemônica, pautado por Diniz-Pereira (2011) como modelo da racionalidade técnica.
Por outro lado, em posição contra hegemônica estão os modelos da racionalidade prática e técnica. Assim, para Diniz-Pereira (2011), o modelo da racionalidade técnica compreende os profissionais da educação capacitam-se por meio de conteúdos científicos e/ou pedagógicos necessários para auxiliarem durante a prática. O modelo da racionalidade prática sublinha a reflexão-na-ação como o ponto central da formação. Por fim, o modelo da racionalidade crítica compreende a educação “historicamente localizada” (DINIZ-PEREIRA, 2011, p. 25) e os professores são sujeitos que levantam problemas a partir de uma visão política sobre ele.
Sobre a formação de professores de Educação Física, Araújo (2020) desenvolve uma importante digressão histórica, apresentando em seis atos as principais estruturas curriculares para os cursos ao longo dos anos. A autora divide a organização das modificações em “seis atos de currículo de formação em Educação Física: 1939, 1945, 1969, 1987, 2004 e 2018” (ARAÚJO, 2020, p. 98). O primeiro ato (1939) apresenta o oferecimento de cinco cursos focalizados na construção dos saberes Anatômicos, Biológicos, Higiênicos, Pedagógicos, Organizacionais e Desportos e Ginásticas, os quais permaneceram no segundo ato (1945). No terceiro ato (1969) surge à organização dos conhecimentos em dois segmentos: as Matérias Básicas (Biologia, Anatomia, Fisiologia, Cinesiologia, Biometria e Higiene) e as Matérias Profissionais (Socorros Urgentes, Ginástica Rítmica, Natação, Atletismo, Recreação e as matérias pedagógicas). O quarto ato (1987), o quinto (2004) e o sexto (2018) mantém a divisão dos saberes de forma que os conhecimentos biológicos permaneçam com suas raízes fincadas nos desenhos curriculares da formação de Educação Física.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A presenta pesquisa lança mão da abordagem metodológica História de Vida, por favorecer a aproximação entre quem pesquisa e o objeto. Esta opção parte do entendimento de que acessar as minhas subjetividades me auxiliarão a compreender para além da minha formação profissional, mas a pessoal também, uma vez que estão atravessadas.
Assim, espero oportunizar a reflexão e a autorreflexão, já que “trabalhar com a memória, seja a memória institucional ou a do sujeito, faz emergir a necessidade de se construir um olhar retrospectivo e prospectivo no tempo e sobre o tempo reconstituído como possibilidade de investigação e de formação de professores.” (DE SOUZA, 2007, p. 63-64). Minha reflexão e memória estarão centradas nos componentes curriculares cursados por mim no período de um ano e meio, mesmo período que participei do subprojeto Educação Física PIBID/UFRJ. Desse modo, a abordagem utilizada almeja, a partir das minhas vivências nas disciplinas obrigatórias, contribuir para a promoção de mudanças na formação do curso de Licenciatura em Educação Física.

UM ANO E MEIO DE GRADUAÇÃO: ANÁLISE DAS DISCIPLINAS CURSADAS
Com base nas concepções de modelos de formação e desenhos curriculares, através das ementas e da memória da minha vivência nas disciplinas obrigatórias, alguns aspectos associados aos modelos de formação destacados acima. Desse modo, diante dos quinze componentes curriculares cursados em paralelo à participação no PIBID/UFRJ, destaco no presente estudo àqueles diretamente relacionados à prática pedagógica e situados na EEFD. Assim, em um ano e meio, cursei as disciplinas obrigatórias: Fundamentos do Handebol, Fundamentos do Voleibol, Fundamentos da Ginástica, Fundamentos da Ginástica Artística e Fundamentos do Futebol (quadro 1).
Quadro 1 – Ementas das disciplinas analisadas
Disciplina Ementa
Fundamentos do Handebol Aspectos da origem e evolução do Handebol. Fundamentos das técnicas e táticas, individuais e coletivas. Noções das regras e o contexto sócio-histórico-cultural. Princípios didático-pedagógicos para o processo ensino-aprendizagem.
Fundamentos do Voleibol Aspectos da origem e evolução do Voleibol. Fundamentos das técnicas e táticas, individuais e coletivas. Noções das regras e o contexto sócio-histórico-cultural. Princípios didático-pedagógicos para o processo ensino-aprendizagem.
Fundamentos da Ginástica Evolução história da ginástica. Metodologia da ginástica. Planejamento didático- pedagógico. Curva de esforço. Formas pedagógicas de abordagem muscular. Seqüência pedagógica de execução das tarefas. Variantes do método de ginástica localizada. Macrociclo, mesociclo e microciclo de treino aplicado.
Fundamentos da Ginástica Artística Aspectos da origem e evolução da ginástica artística. Princípios das técnicas básicas das habilidades motoras específicas. Noções das regras e o contexto sócio-histórico-cultural. Princípios didático-pedagógicos para o processo ensino- aprendizagem.
Fundamentos do Futebol Aspectos da origem e evolução do futebol. Futsal e outros. Fundamentos das técnicas e táticas, individuais e coletivas. Noções das regras e o contexto sócio-histórico-cultural. Princípios didático-pedagógicos para o processo ensino-aprendizagem.
Fonte: Elaborada pelos autores
Com isso, foi possível observar que a única diferença entre as ementas, exceto Fundamentos da Ginástica, está no nome do desporto. Contudo, vejo certa alusão às características críticas ao reconhecer os esportes enquanto manifestações com contexto sócio-histórico-cultural e sua prática didático-pedagógica. Ao mesmo tempo, consigo perceber em “Fundamentos das técnicas e táticas, individuais e coletivas” a efervescência do conhecimento técnico da modalidade para aplicá-lo.
Quando resgato a memória da minha vivência na disciplina Fundamentos do Handebol, essa efervescência ocorreu de fato, visto que não me recordo da apresentação desses aspectos relacionados à concepção crítica, e sim dos fundamentos das técnicas e táticas. Já na disciplina Fundamentos do Voleibol e Fundamentos do Futebol, recordo que a maior parte das aulas estava destinada às técnicas e táticas, mas também houve um momento em que elaboramos um plano de aula em grupo, que foi colocado em prática com os próprios colegas da turma. Desse modo, diante dos levantamentos destes aspectos e características, percebo uma aproximação das experiências supracitadas ao modelo pautado na racionalidade técnica.
Na ementa da disciplina Fundamentos da Ginástica, destaco “Planejamento didático-pedagógico”, “Formas pedagógicas de abordagem muscular” e “Sequência pedagógica de execução das tarefas” em aproximação a aspectos críticos. Nesse componente curricular, evidencio a parceria da disciplina com o projeto de extensão “Educação Física na Baixada Fluminense: Autonomia e Construção de conhecimento” e com o PIBID, que realizam um evento (Encontro De Lá Pra Cá) no qual os estudantes da educação básica vão até à universidade para participarem de oficinas promovidas por estudantes do curso de Licenciatura em Educação Física.
Lembro que até o início do planejamento da oficina, as aulas das disciplinas Fundamentos da Ginástica e Fundamentos da Ginástica Artística, localizadas no mesmo período, não se aproximavam do modelo pautado na racionalidade crítica de formação e sim da técnica. No entanto, ao iniciar o planejamento, a reflexão sobre a prática se fez presente, promovendo uma proximidade maior com aspectos críticos, como a práxis evidenciada por Freire (2019), a saber, ação e reflexão com o objetivo de modificar a realidade vivenciada.
Diante da discussão feita até aqui, identifico que o desenho curricular vivenciado por mim no curso de Licenciatura em Educação Física da UFRJ apresenta alguns traços do currículo de 1969, apontado por Araújo (2020), ao descrever o terceiro ato da formação de professores de Educação Física no Brasil, uma vez que a presença da massificação das disciplinas de esportes e o afastamento de discussões pedagógicas são marcantes do desenvolvimento da militarização das práticas pedagógicas. Ao mesmo tempo percebi a aproximação com os aspectos alinhados ao modelo relacionado à racionalidade técnica, visto que os conhecimentos técnicos foram priorizados, objetivando seu acúmulo para que em momento posterior fosse vivenciado na prática profissional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim, a travessia deste texto possibilitou minha reflexão sobre como os modelos de formação atravessaram as disciplinas obrigatórias vivenciadas por mim, concomitante à minha atuação no subprojeto do PIBID. Através da análise das ementas e da abordagem metodológica biografico-narrativa, que foi essencial para o resgate da minha memória durante a vivência das disciplinas, identifiquei a transposição dos modelos de formação vinculados aos aspectos da racionalidade técnica, além dos resquícios históricos da composição da grade curricular do curso de Licenciatura em Educação Física.

PIBID AND THE OTHER SIDE OF FORMATION:
BETWEEN TECHNICAL AND CRITICAL RATIONALITY

ABSTRACT

This present work is seek to understand how hegemonic and counter-hegemonic teacher education models approached the graduate disciplines I was taking during my acting in PIBID. The Life History methodological approach was fundamental to identify the approximation of the model linked to technical rationality and the remnants of the 1969 curriculum configuration.

KEYWORDS: PIBID; teacher education; curriculum;


PIBID Y EL OTRO LADO DE LA FORMACION: ENTRE LA RACIONALIDAD TÉCNICA Y LA CRÍTICA
RESUMEN

El presente trabajo busca entender cómo los modelos de formación hegemónicos y contrahegemónicos se acercaron a las disciplinas de pregrado que estaba cursando durante mi actuación en PIBID. El enfoque metodológico de Historia de Vida fue fundamental para identificar la aproximación del modelo vinculado a la racionalidad técnica y los remanentes de la configuración curricular de 1969.

PALABRAS CLAVES: PIBID; formación de profesores; reanudar;

Referências


REFERÊNCIAS
ARAÚJO, R. Formação docente em educação física no Brasil: do pensamento curricular à produção do conhecimento. In: SOARES, M.; ATHAYDE, P.; LARA, L. (Org.). Formação profissional e mundo do trabalho [recurso eletrônico]. Natal, RN : EDUFRN, 2020, p. 97-113.

DINIZ-PEREIRA, JE. Capítulo 1: A pesquisa dos educadores como estratégia para construção de modelos críticos de formação docente. In: DINIZ-PEREIRA, JE.; ZEICHNER, K. (org.). A pesquisa na formação e no trabalho docente. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2ª Ed., 2011, p.11-37.

DE SOUZA, E. (Auto)biografia, histórias de vida e práticas de formação. NASCIMENTO, AD.; HETKOWSKI, TM. (org.). Memória e formação de professores [online]. Salvador: EDUFBA, 2007, p. 59-74.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz & Terra, 71ª Ed., 2019.

SAUL, A.; SAUL, A. Contribuições de Paulo Freire para a formação de educadores: fundamentos e práticas de um paradigma contra-hegemônico. Educ. rev., Curitiba, n. 61, Sept. 2016, p. 19-36.

ZEICHNER, K. Repensando as conexões entre a formação na universidade e as experiências de campo na formação de professores em faculdades e universidades. Educação, Santa Maria, v. 35, n. 3, set./dez. 2010, p. 479-504.

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