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O TRABALHO CORPORAL COMO MEDIADOR DAS RELAÇÕES HUMANAS NO CÁRCERE FEMININO
Silvane Fensterseifer Isse, Bibiana Cristine Scheer

Última alteração: 2018-10-21

Resumo


INTRODUÇÃO
Este trabalho discute experiências de um projeto de extensão universitária desenvolvido em um presídio feminino de um município do Rio Grande do Sul, que tem como objetivos problematizar a corporeidade feminina enquanto elemento de linguagem, contribuir para a humanização da permanência das mulheres no presídio, qualificar as relações interpessoais, exercitar a escuta e o acolhimento e desenvolver oficinas de práticas corporais diversificadas. As ações fundamentam-se na ideia de corpo como elemento de comunicação e criação (MARQUES, 2010) e de movimento enquanto experiência ética, estética e criativa (SANTIN, 1995; SERRES, 2001), enquanto elemento de sensibilização humana (SANTIN, 1997).
Segundo Santin (1997, p.4), a sensibilidade é “indispensável para o reencontro da humanidade consigo mesma” e precisa “ser alcançada no seu acontecer” (p.7), pois é vivência, é vida e “se confunde com a vida” (p.9). A sensibilidade é gesto, é sentimento e é capaz “de inventar novas formas de viver” (SANTIN, 1997, p.9). Para Santin, a sensibilidade é livre, é transgressora, é comprometedora, é exigente, é perigosa e

[...] é presença. É estar-junto. É sentir e sentir-se com o outro. É tocar o outro. A mão que toca, que acaricia. A sensibilidade do táctil, o toque da mão, do abraço do beijo possuem uma energia poderosa de aproximação, de presença, de encontro, de comunhão. A tactilidade celebra a fusão entre os corpos pelo prolongamento de um no outro. (1997, p.15-16)

O corpo sensível, assim, coloca-se nas suas relações de forma dialógica, como linguagem, como dispositivo de encontro e comunicação com o outro e articulação de significados coletivos. Assim, conforme Marques (2010), o corpo apresenta-se como texto, que pode ser lido, que pode dizer, questionar ou recusar-se; apresenta-se como discurso que produz significados na, pela e com a linguagem.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O trabalho no presídio iniciou em agosto de 2017. É desenvolvido a partir da capacitação de estudantes bolsistas e grupo de voluntários, na qual são apresentados os objetivos do projeto e a metodologia de intervenção. Após, são planejadas e desenvolvidas oficinas de práticas corporais diversificadas, música, teatro, narração de histórias e fotografia, entre outras atividades. Mensalmente, são realizadas reuniões do grupo para estudo, planejamento e avaliação do trabalho.
As intervenções no presídio acontecem semanalmente, com duração aproximada de noventa minutos, e têm na roda uma das principais metodologias. Quando o clima é favorável, os encontros acontecem no pátio, no horário do banho de sol. Em caso de mau tempo, as oficinas acontecem na galeria ou no refeitório.

A RODA COMO ESPAÇO DE EXPERIMENTAÇÃO CORPORAL E DE CONSTRUÇÃO DE RELAÇÕES HUMANAS
As intervenções iniciam com o convite para participar da roda, quando nos colocamos lado a lado e dirigimos o olhar, a escuta e a fala para o grupo. Assim, as intenções não são individuais, pois a comunicação, o contato e os objetivos são coletivos.
A experiência da dança circular, no seu sentido material, produz efeitos surpreendentes e impactantes. Dançar juntas, tocando e se deixando tocar, relevando as “esquisitices” das colegas têm contribuído para um convívio mais tranquilo e qualificado. Já no sentido simbólico, sentir-se como roda fortalece as relações e os objetivos comuns: o convívio amigável, o apoio afetivo, por meio de experiências corporais, da música, da mímica ou da poesia.
Quando todas as mulheres estão de mãos dadas, lado a lado, balançando o corpo no ritmo da música e dos outros corpos, confiando umas nas outras, a roda acontece! Assim, o corpo é texto, linguagem, expressão daquilo que cada mulher é, sente e pensa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As experiências realizadas no presídio feminino têm contribuído para o maior conhecimento e cuidado das mulheres em relação ao seu corpo, bem como para sua sensibilização, para a qualificação do tempo e a ampliação do diálogo. Conversamos, ouvimos, dançamos, rimos e procuramos contribuir para que se torne visível o valor de cada mulher. A cada semana mergulhamos um pouco mais nesse universo do cárcere feminino. No entanto, nada está pronto. Ao final de cada encontro, surgem novos desafios, já que as expectativas inspiram novos passos.

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